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Ice
Trooper
 

Default A morte sem nome próprio.

28-01-13, 13:08 #1
Texto meu sobre a tragédia de SM. Caso interessar a alguém.

A morte sem nome próprio.

Não estamos habituados com o aleatório das tragédias naturais: nunca vimos no Brasil a terra tremer de forma súbita empilhando corpos por sobre edifícios destruídos, o mar enfurecido inundar o chão por onde pisamos, um tornado arrasar a moradia de milhares de pessoas. Nossas “tragédias” tem um rosto: é o adolescente problemático que mata crianças em uma escola, os policiais que promovem uma chacina no presídio, o motorista embriagado que engendra um acidente fatal.
Nomeando a morte, dando um rosto e estabelecendo culpados conseguimos solidificar a ilusão de que exercemos certo controle sobre o fim. Delineando os porquês de tamanha brutalidade, imaginando os possíveis motivos, traçando “perfis” psicológicos, caímos na mais gostosa e reconfortante falácia moderna: existe uma causa delineável para tudo que acontece ao nosso redor. O matador da escola passa assim a ser um “esquizofrênico que se vingava por ter sofrido bullying quando criança”; o bêbado passa a ser uma vítima do alcoolismo e assim por diante. Assim, se não queremos que determinado evento aconteça, basta extirparmos aquilo que o motivou. “Cortar o mal pela raiz”.
O que fazer então quando a morte não tem nome próprio? Desesperadamente buscamos um culpado para o incêndio em Santa Maria; e o que encontramos? Uma série de erros cometidos pelas mais diversas pessoas: o vocalista da banda que acendeu os fogos, o dono da boate que não planejou uma segunda saída, os seguranças que trancaram as portas etc. Ou seja, diversos eventos isolados que se unem em uma terrível coincidência que nos lança frente ao mais profundo desamparo. O fogo trouxe consigo uma ausência completa de significação: não é a toa que seguimos consumindo mais e mais notícias, acessando mais e mais os meios de comunicação. Queremos um porquê do incêndio ter ocorrido para assim conseguir formar uma fantasia de que poderia ter sido evitado.
Sendo assim, talvez o esforço que nós, profissionais que se colocam ao auxílio das vítimas, devemos empenhar-nos seja justamente esse: ajudar o sujeito no seu esforço de construir uma história. Seja ela religiosa, ateia, criminalista, culpabilista... Não importa. O ato de nomear essa morte, nas suas diferentes formas possíveis, é apostar na restituição da dimensão de cada um enquanto sujeito frente ao aleatório da tragédia.





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rockafeller
Chief Rocka
 

28-01-13, 13:14 #2
*têm um rosto

*conseguirmos

*em seu esforço

*essas mortes




e a ultima frase não tem o menor sentido.



no mais, bom texto.

rockafeller is offline   Reply With Quote
Oleleh
Trooper
 

28-01-13, 13:27 #3
Que nota entao vc daria, professor rocka?

Oleleh is offline   Reply With Quote
rockafeller
Chief Rocka
 

28-01-13, 13:38 #4
7,2

rockafeller is offline   Reply With Quote
Ice
Trooper
 

28-01-13, 13:55 #5
Não entendo pq a DS nem o facebook mantém a estrutura dos parágrafos =(

Ice is offline   Reply With Quote
Stranger
Trooper
 

28-01-13, 14:06 #6
Culpa sua.

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Kenny
Trooper
 

28-01-13, 14:06 #7
Quote:
Postado por Ice Mostrar Post
Não entendo pq a DS nem o facebook mantém a estrutura dos parágrafos =(
Esse é o "massimo da rebeudia" da DS ...

Btw, belo texto.

Kenny is offline   Reply With Quote
Eon
Trooper
 

28-01-13, 20:29 #8
Creio que a ausência completa de significação não se aplica apenas as tragédias, mas a todos os aspectos da vida atualmente. As tragédias apenas aceleram essa percepção.

Convenhamos, é uma sociedade que cada vez mais identifica "prazer" com o "bem", e "sofrimento" com o "mal". A morte por sua vez é algo totalmente repulsivo que deve ser evitado a qualquer custo, e a morte de jovens então... passa a ser quase inaceitável. É claro que uma sociedade fundada sobre esses princípios não tem condições de lidar com sofrimento em grande escala.

Pra mim o que chocou mais nessas tragédias recentes não foram as tragédias em si, mas o vazio existencial que se reflete nos comentários da opinião pública toda vez que elas se abatem. Um sociedade com cada vez menos conteúdo deixa um silêncio ensurdecedoramente constrangedor quando tenta buscar conforto numa catarse coletiva!

Eon is offline   Reply With Quote
Zedd
Trooper
 

28-01-13, 21:27 #9
Exato, exceto pelo fato de que a sociedade tem cada vez mais conteúdo, é mais moral; as pessoas são cada vez mais felizes, mais inteligentes e realizadas e o seu sentimento de derrotismo vem do fato de que as novas gerações já ultrapassaram seus pontos de visto atrasados.

"O que chocou mais" foi a morte de 250 pessoas muito antes da hora.
Você sabe o que eu sinto de quem propaga essa idéia, mesmo veladamente, de que a culpa disso é minha? Pena.

Zedd is offline   Reply With Quote
Gerson
Trooper
 

28-01-13, 21:27 #10
Belo texto mesmo, ice.

Gerson is offline   Reply With Quote
Eon
Trooper
 

28-01-13, 23:02 #11
Zedd, eu não vejo derrota na morte, logo se há um sentimento de derrotismo no ar ele certamente não é meu...

Vejo muitos comentários do tipo "precisa haver mais fiscalização", mas alguém realmente acredita que se criarmos regras o suficiente o mundo pode ficar definitivamente livre de tragédias?

A verdade é que há uma pressão social tremenda para que as pessoas projetem imagens de felicidade, realização, conteúdo, inteligência, etc. E a tragédia maior talvez seja o que as pessoas fazem consigo mesmas quando a vida lhes frusta os planos, quando impõe algo menos do que gostariam de ser ou projetar para os outros.

É interessante que reportagens busquem valorizar os atributos das vítimas que façam elas parecerem mais vítimas, e isso tem tudo a ver com os parâmetros que a própria sociedade usa pra julgar quem é quem: se o defunto era jovem, na casa dos 20 anos, universitário, inteligente-com-conteúdo-feliz-e-realizado... é claro que a tragédia é maior.

Então procura-se culpados na mesma proporção, e como bem disse o Ice, isso vira um exercício de eliminar as supostas causas do sofrimento, na expectativa de um dia fiquemos livre dele em definitivo. E como isso não acontece nunca, o que sobra é frustração, seguida de uma ansiedade que não pode ser preenchida de forma adequada.

O fato é que não há culpados o suficiente no mundo para aliviar a dor que a perspectiva da morte provoca naqueles que não acreditam que possa haver algo além da vida. Para esses, infelizmente não há esperança, só há desespero frente a perda daqueles que foram "antes da hora".

Não é nisso que eu acredito, por isso digo o seguinte: ninguém vai antes da hora, e há esperança mesmo naquilo que nós, na nossa ignorância, chamamos de "tragédia", "dor" e "sofrimento".

E pelo menos para mim, isso é motivo de alegria!

Eon is offline   Reply With Quote
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